SELVA IMPONENTE
No silêncio da madrugada
entrámos na selva imponente…
abrindo caminho, de rostos suados,
avançam silenciosamente
os valentes soldados.
A surpresa quebrada com alarido
espanta a passarada que voa
além da confusão do silêncio
dos disparos feitos à toa...
o timbre grave do inferno
com clamores de agonia
e gritos desesperados
forma a sarcástica sinfonia!
Há mistérios que a noite oculta
na escuridão das matas do Úcua
com um ambiente desdenhoso
onde a morte é uma princesa
vivendo o feito clamoroso
de atiçar o fulcro da guerra
nos espaços etéreos…
o campo de cadáveres do reino
não tem adornos funéreos
e o trono é um sepulcro!
Damba, Maio de 1962
Joaquim Coelho
ÊXODO
“… e porque a Pátria está em perigo,
Temos que combater o inimigo…”
(O.S.153)
Em frente dos meus olhos
os soldados embarcam aos molhos
na rota dos históricos caminhos…
há um rumor de ventos revoltos
a sacudir os pássaros dos ninhos.
Sem querer, logo imagino
tanta gente em debandada
como as aves sem asas
fugindo à nossa chegada…
escurraçados os desgraçados
das palhotas, espécie de casas.
Sem queixumes na voz dolente
os excomungados da história
abrigam-se rapidamente
das investidas dos soldados
que ouvem frases indecentes
e sentem-se logo provocados.
Em frente dos meus olhos
as florestas com clarões
das velhas cubatas em chamas
ignoramos a cor das camuflagens
e as expressões mais banais
dos gritos doloroso e selvagens
de quem ficar para os chacais.
Quicabo, Janeiro de 1962
Joaquim Coelho
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FINO ARPEJO
Naquela noite da densa neblina
o ar abafado atrofiava o fino harpejo,
a voz perturbada pela melancolia
difundia estranhos sons tensos;
não resisti ao chamamento,
um longo desabafo preguiçoso
aceitou o gozo ingénuo oferecido
no contorno dos dedos a tactear
os sulcos do teu corpo sedutor.
Descarregaste uma lufada de beijos
entregues ao sabor dos desejos,
e tocavas no fino harpejo…
crescia a vontade com o gesto
dos corpos em convulsão, ofegantes
silêncio nas bocas electrizantes;
soltou-se o meu arpão modesto
e os olhos subtilmente encerrados
deixaram que os corpos serenos
se relaxassem entrelaçados
saboreando o que comemos!
Luanda, Junho de 1962
Joaquim Coelho
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