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TEMPOS DE MUDANÇA
Aterrei nas pistas de Luanda
numa manhã de sol prometedor.
Cheguei com a vontade firme
de dar um contributo reparador
aos massacres desta banda...
Ninguém pode ficar indiferente
Perante a brutal mortandade
que atingiu tanto inocente.
Ao sexto mês de escaramuças,
nas matas densas de Angola,
os saldados sentem a morte
em todos os caminhos do norte...
avanam em alerta, fortes,
sem temer a fatal desdita...
no sossego do arame farpado
ouve-se o falar das trincheiras:
o Fernando Farinha no seu fado
que nos vai dando algum alento.
Oito meses... alastra a guerra!
Perigos graves e nova metralha...
em cada combate há mais despique;
as armas da UPA respondem em terra,
mais finas, com certeira precisão,
escapam às bombas lançadas a pique;
e os soldados do Exército, à toa
não recebem novas de Lisboa,
inocentes, vão caindo no caixão!
Restos de tropas impreparadas...
à sorte, vão ficando abandonadas
para além do rio Dange, perdidas
dos Dembos até ao Congo, sem meças
nas lavras do Lifune, cortam cabeças
e deixam abertas outras feridas.
Toto, Março de 1962
Joaquim Cacuaco
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A MÍSTICA DO BATUQUE
Em noites de refulgente luar
os corpos todos se agitam
ao som do tam-tam-tam
onde mais emoções palpitam.
- Por quinze tostões e um doce
podes ter o meu corpo quente
não pagas imposto, e se fosse
uma noite bem diferente?
Assim falou a mulatinha
de voz piamenta e terna,
ao roçar na minha perna!
É a miséria madura e crua
da menina que se oferece nua
na esteira em noite escura
ao som das marimbas pretas
dos batuques desta rua
onde gemem as silhuetas
que rasgam negros desejos.
A vida nos bairros fantasmas
onde resvalam os beijos
e os lamentos de solidão...
são arestas, são escamas
a torturarem a tesão!
Luanda, Janeiro de 1962
Joaquim Coelho
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