Ah, como é medonho
o sofrimento dos soldados
que mandaram para o planalto…
abandonados!
Privados do imaginado sonho
de darem o salto
como o fazem os desertores
em demanda do sustento;
ou como os exilados e traidores
à deriva do cata-vento.
Os navios deixam-nos na costa
(Porto Amélia ou Mocímboa da Praia)
já com saudades da catraia,
sempre crentes na aposta
da longínqua ideia difusa
do regresso à pátria-lusa.
Habilidosos no desenrasca,
não se afoitam em valentia
por saberem que qualquer dia
a caravana se atasca.
Vivem tempos de privações
cercados de arame farpado
em dias de intensas aflições
com o inimigo marafado.
Sentem o desconforto do abrigo
que os protege da morteirada
e da metralha do inimigo
que ataca pela alvorada.
Mas… o que mais entristece
é ver tombar um companheiro
cujo corpo arrefece
à sombra do embondeiro.
Sinto a violenta combustão
da alma que reclama
contra a ingrata humilhação
do sono em tosca cama
- uma sepultura sem caixões
feita pela lua cheia
onde os corpos esfacelados
pelas explosões
são embrulhados
na tenebrosa teia.
Vou deixar de pintar a realidade
e juntar-me aos que vivem às escuras
longe das noites inacabadas.
Sim… vou fechar os olhos e deixar
que a lua mostre a verdade
da vida dentro das barricadas
com a saudade a mastigar
o que resta da alma pura…
onde, sem dó nem piedade
esperamos a última amargura.
Mueda, Novembro de 1967
Joaquim Coelho
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