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sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Poemas do Tempo da Guerra 12

.. NATAL DOS DESENGANOS
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Natal de profundo tédio...
onde a minha tristeza se amortalha!

A esta amargura não há quem valha...
a solidão e a morte amedrontam
na hora da tormentosa batalha
que ensombram a luz dos meus dias.

Treme o coração e vão-se as alegrias
nem sei se esta paixão aguenta
um cenário com tamanha tormenta.

Os sonhos não passam de quimeras
neste Natal sem uma réstia de claridade,
com as dores do tempo da mediocridade
já nem sei porque me esperas...

Um Natal assim, longe do mundo,
a marcar o rumo negro e funesto
limitando o meu sentimento profundo,
atira-me para o ambiente que detesto:

bichos misturados com seres humanos,
mistificação das acções determinadas
e os confrontos de virtudes caluniadas
agravam os tormentos e os desenganos.

Luanda, Natal de 1962
Joaquim Coelho
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.. TEMPO DE PAZ
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Como as bestas no deserto
percorro os trilhos das matas tropicais
à procura do tempo de paz
onde possa amar no silêncio
da felicidade que invento.

Pergunto aos pássaros que passam
por onde é o caminho p’ra liberdade
que nos anime os dias de ansiedade
e traga o sonho em noite de cacimbo
onde os rumores do vento infiltrado
cantem a verdade deste desejo
descoberto nos lábios da lucidez
que a vida cultiva na tua nudez.

Antes de sucumbir à fúria das balas
queria passear pelo teu ventre
e apertar-te nos meus braços mansos
até descobrir a razão deste amor
que me cativa o coração.

E logo ao entardecer…
de regresso ao reboliço da cidade
vou embebedar-me de beijos
e espairecer na praia da Corimba
saborear o bico dos teus seios
como a natureza debica a terra
para a fertilizar com as sementes
que a espiga debita longe da guerra.

Luanda, Outubro de 1962
Joaquim Coelho




.. ACASALAMENTO
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Hoje estou disponível para o amor!
só de pensar que estás por aí…
fico feliz, receoso dos dias
em que me assalta a saudade.

Aí princesa… quem me dera
que o amor fosse uma quimera
espalhada pelo vento da manhã!
Pois perceberia que na Primavera
o som do chilrear dos pássaros
que se apressam a fazer os ninhos,
quando é chegado o momento,
simplesmente, porque o cio
atiça as labaredas do acasalamento.

Palpita-me que imitando os pássaros
vou encontrar os esconderijos secretos
para deleitar-me nos teus braços
irremediavelmente abertos ao amor
construído no silêncio do desejo.

Finalmente, verei a luz no teu olhar
que me guiará com a sensualidade
assumida nos contornos do corpo
a desnudar-se frente ao espelho
talhado dentro dos meus olhos…
onde um raio de vida inesgotável
se afirma nos sussurros de cada noite.

Luanda, Setembro de 1962
Joaquim Coelho
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.. POEMA dos DESENGANOS
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Embarcámos na noite escura,
como de costume...
em busca do amor que escasseia,
já pressentia
a noite que se refugia
no negrume dos sonhos sem mistura
dos gestos secos, inconfundíveis,
e a coisa dura,
na curta história dos corpos fechados
com emoções invisíveis…

corpos vadios e fingidores,
entrelaçados nas nossas dores,
passam o tempo em volta de nós,
bocas serenas quase sem voz;
roliça, danças feliz, quase louca,
se queres servir-te de coisa pouca,
aproveita que não é tua...
antes que eu saia, e apague a lua!

Luanda, Janeiro de 1962
Joaquim Coelho
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